Evocar o futebol dos anos 30 do século passado significa recordar um enorme leque de mitos da arte do pontapé na bola como Leónidas, Zamora, Combi, Meazza, José Leandro Andrade, entre muitos, muitos outros.
Recordá-los é voltar a um mundo romântico hoje inexistente. Não nos resta pois senão olhar as velhas fotografias a preto e branco e os relatos escritos nas esbatidas enciclopédias do belo jogo para sentir por alguns minutos a magia de um tempo que não mais irá voltar. O leitor terá já percebido que a viagem no tempo que hoje iremos fazer será até ao corredor das lendas, dos magos, dos imortais deste jogo que tanto nos encanta, imortais como Matthias Sindelar… o Mozart do futebol.
Por alturas das décadas de 20 e 30 do século XX falar da Áustria era muito mais do que presentear o nosso espírito com uma obra de arte musical “esculpida” pelo génio de Mozart, era também regalar a alma com um novo estilo de futebol. Um estilo que revolucionou técnica e tacticamente o jogo, assemelhando-se a uma arrepiante e deslumbrante valsa. Tudo isto nascia graças à mente brilhante de um jovem judeu oriundo de uma abastada família de Viena que com esta “revolução” conferiu à Áustria o “título” de melhor equipa do Mundo dos finais dos anos 20 e princípios de 30. O seu nome? Hugo Meisl.
A Áustria de Meisl ficou mundialmente conhecida como a “Wunderteam”… a Equipa Maravilha. Bateram durante esse período áureo gigantes do Mundo do futebol da época… Alemanha (6-0), Escócia (5-0), Suíça (8-1), ou Hungria (8-2). Meisl comandava a equipa desde o banco mas dentro do campo a orquestra era dirigida por um jovem loiro, de aspecto muito frágil, nascido a 10 de Fevereiro de 1903 no seio de uma humilde família de Viena, de seu nome Matthias Sindelar.
Avançado-centro ele era a estrela do “Wunderteam” de Meisl, tornando-se célebre pela sua sublime técnica de conduzir a bola, parecendo por vezes tocá-la ao som de uma valsa, com movimentos suaves e mágicos. E tudo debaixo de uma figura frágil, pálida, que lhe valeria a alcunha de “homem de papel”. A paixão pelo jogo correu-lhe pela primeira vez nas veias quando ainda adolescente, num tempo em que era apanha-bolas dos treinos do Hertha de Viena.
De apanha-bolas a estrela do clube o caminho foi curto. Ali ficou até 1924, altura em que se transferiu para um dos poderosos do futebol austríaco, o Wiener Amateur, clube que posteriormente daria origem ao Áustria de Viena. Por este emblema jogaria até ao final da sua carreira (1939), conquistando um campeonato da Áustria e duas Taças Mitropa (uma das antecessoras da actual Taça/Liga dos Campeões Europeus) em 1933 e 1936.
As marcas do seu perfume ficaram espalhadas em vários episódios da saga do “Wunderteam”. Um deles aconteceu no Mundial de 1934, ocorrido em Itália... num tempo em que o fascismo ditava leis. E foi graças ao fascismo que Sindelar e a sua Áustria foram impedidos de se tornarem naturalmente nos melhores do Mundo. Acontece que Benito Mussolini, por interferência indirecta, roubou, sim, este é o termo certo, aquela que seria uma mais do que justa coroação à melhor selecção do Campeonato do Mundo de 34.
Áustria que partia para este Mundial como a principal favorita ao título, começando por afastar a França, posteriormente a Hungria, até cair aos pés da Itália nas meias-finais. Num jogo épico em realizado em Milão o fascismo derrotava o “Wunderteam”, tendo o mago Sindelar sido muito maltratado (pontapeado e agredido a soco serão os termos mais correctos) ao longo de todo o encontro por Luigi Monti sem que o árbitro sequer tivesse feito qualquer sansão ao italiano. Resultado final, 1-0 para a equipa da casa, que mais uma vez de forma ridícula (ante a Espanha na eliminatória anterior havia sido igualmente abençoada pelo árbitro) era levada ao colo até à a final com um golo claramente ilegal. Mas quem mandava era Mussolini, cuja pátria natal tinha de vencer aquele Mundial custe o que custasse!
Já com a Áustria anexada a Alemanha foi para o Mundial de 1938 (em França) com uma equipa onde pontificavam algumas estrelas do “Wunderteam” de Meisl. Contudo, Sindelar, recusou vestir a camisola germância, um acto tido como provocador que lançaria mais uma acha para a fogueira da ira nazi que suspeitava que o “homem de papel” fosse judeu.
A sua morte é ainda hoje um enorme mistério que paira sobre Viena. Conta-se que na madrugada de 23 de Janeiro de 1939 recebeu um telefonema da sua companheira Camila Castagnola, uma prostituta italiana radicada em Viena. Sindelar encontrava-se reunido com alguns colegas de profissão num café da capital. O “homem de papel” dirige-se então para a Rua Anna, morada de Camila, e de lá não volta a sair.
Os amigos estranham a sua ausência no café pela manhã desse dia 23, e um deles que havia visto Matthias entrar na casa da sua amante resolve fazer uma visita ao local, e eis que quando ai chegado encontra os dois amantes estendidos no chão com uma garrafa de conhaque e dois copos. Sindelar estava morto e Camila muito perto de o estar também. A autópsia revelou intoxicação por óxido de carbono, porém outras teorias se levantaram na altura, como a de suicídio (dizem que abriu as torneiras do gás) quando pressentiu que as tropas de Hitler avançavam fulgurantemente a caminho de Viena.
Tinha 36 anos, e Viena chorou a morte de um homem que anos mais tarde se viria a saber que nem judeu era! Uma multidão incorporou o funeral do maior jogador austríaco de todos os tempos, o qual por 43 vezes deslumbrou o Mundo com a camisola da sua Áustria colada à pele.
Recordá-los é voltar a um mundo romântico hoje inexistente. Não nos resta pois senão olhar as velhas fotografias a preto e branco e os relatos escritos nas esbatidas enciclopédias do belo jogo para sentir por alguns minutos a magia de um tempo que não mais irá voltar. O leitor terá já percebido que a viagem no tempo que hoje iremos fazer será até ao corredor das lendas, dos magos, dos imortais deste jogo que tanto nos encanta, imortais como Matthias Sindelar… o Mozart do futebol.
Por alturas das décadas de 20 e 30 do século XX falar da Áustria era muito mais do que presentear o nosso espírito com uma obra de arte musical “esculpida” pelo génio de Mozart, era também regalar a alma com um novo estilo de futebol. Um estilo que revolucionou técnica e tacticamente o jogo, assemelhando-se a uma arrepiante e deslumbrante valsa. Tudo isto nascia graças à mente brilhante de um jovem judeu oriundo de uma abastada família de Viena que com esta “revolução” conferiu à Áustria o “título” de melhor equipa do Mundo dos finais dos anos 20 e princípios de 30. O seu nome? Hugo Meisl.
A Áustria de Meisl ficou mundialmente conhecida como a “Wunderteam”… a Equipa Maravilha. Bateram durante esse período áureo gigantes do Mundo do futebol da época… Alemanha (6-0), Escócia (5-0), Suíça (8-1), ou Hungria (8-2). Meisl comandava a equipa desde o banco mas dentro do campo a orquestra era dirigida por um jovem loiro, de aspecto muito frágil, nascido a 10 de Fevereiro de 1903 no seio de uma humilde família de Viena, de seu nome Matthias Sindelar.
Avançado-centro ele era a estrela do “Wunderteam” de Meisl, tornando-se célebre pela sua sublime técnica de conduzir a bola, parecendo por vezes tocá-la ao som de uma valsa, com movimentos suaves e mágicos. E tudo debaixo de uma figura frágil, pálida, que lhe valeria a alcunha de “homem de papel”. A paixão pelo jogo correu-lhe pela primeira vez nas veias quando ainda adolescente, num tempo em que era apanha-bolas dos treinos do Hertha de Viena.
De apanha-bolas a estrela do clube o caminho foi curto. Ali ficou até 1924, altura em que se transferiu para um dos poderosos do futebol austríaco, o Wiener Amateur, clube que posteriormente daria origem ao Áustria de Viena. Por este emblema jogaria até ao final da sua carreira (1939), conquistando um campeonato da Áustria e duas Taças Mitropa (uma das antecessoras da actual Taça/Liga dos Campeões Europeus) em 1933 e 1936.
As marcas do seu perfume ficaram espalhadas em vários episódios da saga do “Wunderteam”. Um deles aconteceu no Mundial de 1934, ocorrido em Itália... num tempo em que o fascismo ditava leis. E foi graças ao fascismo que Sindelar e a sua Áustria foram impedidos de se tornarem naturalmente nos melhores do Mundo. Acontece que Benito Mussolini, por interferência indirecta, roubou, sim, este é o termo certo, aquela que seria uma mais do que justa coroação à melhor selecção do Campeonato do Mundo de 34.
Áustria que partia para este Mundial como a principal favorita ao título, começando por afastar a França, posteriormente a Hungria, até cair aos pés da Itália nas meias-finais. Num jogo épico em realizado em Milão o fascismo derrotava o “Wunderteam”, tendo o mago Sindelar sido muito maltratado (pontapeado e agredido a soco serão os termos mais correctos) ao longo de todo o encontro por Luigi Monti sem que o árbitro sequer tivesse feito qualquer sansão ao italiano. Resultado final, 1-0 para a equipa da casa, que mais uma vez de forma ridícula (ante a Espanha na eliminatória anterior havia sido igualmente abençoada pelo árbitro) era levada ao colo até à a final com um golo claramente ilegal. Mas quem mandava era Mussolini, cuja pátria natal tinha de vencer aquele Mundial custe o que custasse!
Já com a Áustria anexada a Alemanha foi para o Mundial de 1938 (em França) com uma equipa onde pontificavam algumas estrelas do “Wunderteam” de Meisl. Contudo, Sindelar, recusou vestir a camisola germância, um acto tido como provocador que lançaria mais uma acha para a fogueira da ira nazi que suspeitava que o “homem de papel” fosse judeu.
A sua morte é ainda hoje um enorme mistério que paira sobre Viena. Conta-se que na madrugada de 23 de Janeiro de 1939 recebeu um telefonema da sua companheira Camila Castagnola, uma prostituta italiana radicada em Viena. Sindelar encontrava-se reunido com alguns colegas de profissão num café da capital. O “homem de papel” dirige-se então para a Rua Anna, morada de Camila, e de lá não volta a sair.
Os amigos estranham a sua ausência no café pela manhã desse dia 23, e um deles que havia visto Matthias entrar na casa da sua amante resolve fazer uma visita ao local, e eis que quando ai chegado encontra os dois amantes estendidos no chão com uma garrafa de conhaque e dois copos. Sindelar estava morto e Camila muito perto de o estar também. A autópsia revelou intoxicação por óxido de carbono, porém outras teorias se levantaram na altura, como a de suicídio (dizem que abriu as torneiras do gás) quando pressentiu que as tropas de Hitler avançavam fulgurantemente a caminho de Viena.
Tinha 36 anos, e Viena chorou a morte de um homem que anos mais tarde se viria a saber que nem judeu era! Uma multidão incorporou o funeral do maior jogador austríaco de todos os tempos, o qual por 43 vezes deslumbrou o Mundo com a camisola da sua Áustria colada à pele.
2 comentários:
Excelente rubrica, gostava de saber mais sobre antigas glorias dos tres grandes
Bom artigo. Não fazia ideia. PArabéns!
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